maomé e a montanha

Se eu não for até ti, tu não vens até mim. É a rotina. Só me procuras quando pressentes o meu afastamento e quando adivinhas algo de seriamente errado, porque de resto, se eu quiser, que dê notícias. Se bem me aprouver, eu que formule as interrogações e que procure os vestígios do amor nos teus atos banais e que ache a tua atenção nos intervalos das tuas preocupações. Se eu não for ao teu encontro, posso sentar-me eternamente à espera, e à espera ficar por tempo indefinido. Não me procuras mesmo sabendo que é do teu carinho que necessito e que é do calor da tua voz que eu retiro as forças que me mantêm em pé dia após dia. Tu és a montanha e eu sou Maomé que te procura, sabendo que nunca te moverás desse mesmo lugar em que te encontras para vir até mim. E esforço-me, e gasto as minhas forças, e sucumbo por vezes, nessa travessia tão dura que é não perder a motivação. 

E adoro quando me fazes pensar de outra maneira. Quando me surpreendes com a mais simples e verdadeira das atitudes. Quando me devolves a motivação para te procurar sempre, mesmo quando o meu coração se aperta de dor. Adoro quando ages inesperadamente, quando não sou eu que tenho de achar em ti a atenção que preciso que me dês. Adoro quando vens até mim. Só tenho pena que isso seja mais raro do que o contrário. Dói ter a noção de que és capaz de ficar sem mim, sem a minha presença e sem a minha voz durante mais tempo do que eu consigo imaginar-me sem ti. Dói não saber o que estás a fazer, o que te vai na cabeça ou se estás sequer a pensar em mim. Com quem estás, o que te está a roubar o tempo que não me concedes. Sou consumida por essa dor, mas não vou ser eu a procurar-te desta vez. Não posso. A rotina esgotou-me.